Bio e Japão: parceria pela saúde
Visando reduzir a dependência externa no fornecimento da vacina, o governo brasileiro começou a apoiar projetos voltados para o desenvolvimento de imunobiológicos. Por meio de um acordo de Cooperação Técnica entre a Universidade de Osaka (Fundação Biken), Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica) e a Fiocruz, em 1980, ficou estabelecida a criação de uma planta de produção da vacina sarampo em Bio-Manguinhos. O projeto foi implementado em quatro anos e o Comitê de Coordenação tinha o atual presidente do Conselho Político e Estratégico de Bio (CPE), Akira Homma, como chefe. Representando a parte japonesa, estava Konosuke Fukai, professor da Universidade de Osaka. Dezenas de peritos japoneses vieram para colaborar e acelerar o desenvolvimento do projeto. “Fazemos menção específica para o perito Terumassa Otsuka que ficou entre nós, com a família, por 3 anos, tendo inclusive aprendido português, possibilitando uma boa comunicação com os profissionais da casa”, declara Akira.
Álbum com fotos da visita dos peritos japoneses ao Rocha Lima, com legendas em japonês
Imagem: Acervo do Arquivo Intermediário de Bio-Manguinhos
De acordo com informações da ata da reunião realizada em 18 de julho de 1983, a Cooperação Técnica japonesa para o projeto foi prorrogada por mais um ano, conforme Protocolo de Discussões, assinado pela Jica e autoridades ligadas ao governo brasileiro. O período de extensão foi de agosto de 1983 a agosto de 1984. No mesmo documento, há informações de que “o fruto do projeto tem contribuído bastante com o PNI". O fato foi destacado em texto produzido pela Assessoria de Comunicação Social do Ministério da Saúde (1983), que descreve detalhes da reunião. “Brasil e Japão assinaram hoje, em Brasília, protocolo de discussão recomendando a prorrogação de mais um ano do projeto japonês de Cooperação Técnica, firmado em 1980. O documento foi firmado pelo chefe do grupo japonês de avaliação, da Agência Japonesa de Cooperação Técnica, Konosuke Fukai e pelo presidente da Fiocruz, Guilardo Martins Alves”.
Produção da vacina sarampo nos anos 80
Imagem: Acervo Pessoal / Teresinha Elisa de Brito
O documento destaca que a cooperação “propiciou completa transferência de tecnologia para a produção da vacina contra o sarampo”. Pelo acordo, cabia ao governo japonês o envio de peritos, a participação técnica do planejamento e montagem dos laboratórios, treinamento dos técnicos brasileiros no Japão, fornecimento de máquinas, equipamentos e insumos para preparo da vacina e participação na avaliação de campo. A equipe liderada por Konosuke Fukai visitou o Brasil de 13 a 22 de julho de 1983, com o propósito de avaliar as realizações da cooperação no período de extensão. No mesmo ano, a demanda do Ministério da Saúde para o Programa Nacional de Imunizações (PNI) era de 15 milhões de doses de vacina sarampo. Cinco lotes experimentais consecutivos foram produzidos com sucesso e aprovados pelo Controle de Qualidade em 1982, avaliados em crianças de 6 a 12 meses, em 9 cidades do norte e nordeste.
Histórias e memórias
Akira Homma e Mariza Lima no Fiocruz pra você - 1984 - Campanha contra Sarampo
Imagem: Acervo Pessoal /Mariza Lima
A gerente do Projeto da Vacina Tríplice Viral (TVV) de Bio-Manguinhos, Mariza Cristina Lima, ingressou na unidade um ano antes e acompanhou todo o processo. “O projeto da vacina sarampo foi o meu primeiro grande trabalho em Bio. De 1988 a 1998, chefiei a produção de vacinas virais”, relembra. Lima destaca que, na época, a unidade era pequena, com aproximadamente 200 funcionários e a equipe da produção era conhecida como “família sarampo”. “Nosso compromisso permanente era produzir as doses necessárias para atender ao PNI”, declara. A chefe da Divisão de Produção de Células (DIPRC), Teresinha Elisa de Brito, na unidade desde 1980, trabalhou com Mariza desde o início do projeto e recorda, com orgulho, que ambas participaram do primeiro projeto de transferência de tecnologia da unidade, o da vacina sarampo. “Aprendemos muito, em todas as etapas, da formulação à rotulagem. Naquela época, não imaginávamos como nosso trabalho seria importante para mudar o cenário da saúde no país”, confessa.
Mariza Lima e Terezinha relembram os desafios da produção da vacina na década de 80
Imagem: Isabela Pimentel - Ascom/Bio-Manguinhos
Trocas e aprendizados
O processo de transferência de tecnologia foi marcado pela intensa troca de conhecimentos entre peritos japoneses, que trabalharam durante todo o processo em Bio-Manguinhos e pela ida de 30 profissionais brasileiros ao Japão para treinamento nos laboratórios de produção. Do lado japonês, quatro peritos permaneceram em Bio por três meses, em 1983 e um, durante todo o processo. A gerente do Projeto TVV conta que a convivência com os japoneses foi uma experiência enriquecedora para os dois lados. “Às vezes, falávamos por mímica, pois eles não entendiam inglês”, brinca. A disciplina, organização e espírito sistemático na condução dos processos, foram, para Teresinha, as principais “heranças” japonesas.
Funcionários de Bio ao lado de um dos peritos japoneses
Imagem: Acervo Pessoal /Mariza Lima
Entre abril e junho de 1982, foram realizados treinamentos, adequação da metodologia de controle e produção da vacina, seguidos pela instalação da máquina de envasamento da vacina sarampo no Laboratório de Liofilização (Lalio) , localizado no Pavilhão Rockefeller, além da realização de testes de equipamentos. Em 1983, fixou-se a rotina de produção da vacina, com estabelecimento do esquema de teste e instalação do túnel de esterilização, no Lalio. Em 1987, foram entregues ao PNI 12,5 milhões de doses da vacina sarampo monovalente (5 doses) e em 1990 15,1 milhões. Em 2003, a vacina sarampo monovalente foi descontinuada, sendo substituída pelo tríplice viral, que combate, além do sarampo, caxumba e rubéola. Em 2004, foram entregues ao PNI 20 milhões de doses.
Mariza Lima e Darcy Akemi com perito japonês no laboratório de controle da qualidade
Imagem: Acervo Pessoal /Mariza Lima